quinta-feira, 4 de novembro de 2010

A morte das borboletas.

Quando eu era mais nova, fazia o tipo romântica convicta, porém desprovida de qualquer experiência dessa espécie, sonhava com o dia em que de fato me apaixonaria. Não me contentava com um caso qualquer, queria um romance, igual aos dos filmes - paixão arrebatadora, borboletas no estômago e um final feliz!
Decepção após decepção, me deixou cansada dessa busca interminável, decidi então que, pelo menos por hora, deixaria minha saga amorosa de lado para me focar em outras coisas.. foi ai que meu suposto príncipe encantado surgiu em seu cavalo branco.

 Na época, eu ainda fazia faculdade, ele era de outro curso, mas andava junto com alguns caras da minha roda de amigos, foi assim que o conheci. Quando o vi pela primeira vez, foi num bar, perto da faculdade. Ainda me lembro de como ele estava vestido, usava uma camiseta preta, calça jeans e all star, ele não era tão bonito, mas seu charme me deixou de cara interessada! Aparentemente também se interessou por mim, pois depois de algumas cervejas veio falar comigo, como quem não quer nada. A conversa fluiu naturalmente, tão naturalmente que mal percebemos que a maioria das pessoas da mesa já tinham ido embora. Ele se ofereceu para me levar em casa, e como queria mais um tempo com ele, aceitei.. ficamos conversando por mais um tempo, e com um beijo em minha testa, se despediu.
 Mas como tudo na minha vida não há de ser fácil, existia um problema e esse problema tinha nome: namorada! Mas mesmo assim, nos víamos todos os dias durante todo o mês, é claro que como amigos. Fomos nos conhecendo, tudo em nós era absurdamente compatível, não deu outra.. me apaixonei! Mas não podia trair meus princípios, ele era um cara comprometido, então mantive minha paixonite em segredo, mesmo que uma parte de mim sentisse que ele tinha os mesmos sentimentos, eu jamais poderia ter certeza!
 Como nos tornamos amigos, conversávamos sobre tudo, inclusive sobre a tal namorada, e num dia ele me disse que seu relacionamento estava em crise, e que não tinha mais tanta certeza se era com ela que devia ficar! E então fez uma pergunta que tirou meu chão:
- Má, cê acha possível  gostar de duas pessoas ao mesmo tempo?
- Não sei, discorra sobre..
-Não entenda mal, eu amo minha namorada, mas eu conheci outra pessoa que me fez sentir algo que eu jamais tinha sentido antes. Quando ela aparece meu coração dispara, as coisas parecem ficar em slow motion e tudo fica em preto e branco e só ela em cores, sei que é meio piegas, mas isso nunca tinha acontecido antes!
 Com uma ponta considerável de esperança de que fosse eu a tal garota, respondi:
- Eu realmente não sei, você tem que pensar muito bem sobre, é uma situação delicada.. mas se é tão forte quanto você diz, cara, não deixa passar, eu tenho esperado por isso a minha vida toda e ainda não aconteceu!

 Ele sumiu por alguns dias, só voltei a vê-lo na semana seguinte quando apareceu em casa junto com os caras da minha sala! Ele parecia um pouco envergonhado, imaginei que era por ter vindo sem avisar, mas não era exatamente o motivo. Quando os meninos saíram para comprar as bebidas, só ele ficou. Gastamos um tempo conversando na sacada, foi quando me contou que tinha terminado com a namorada, meu coração quase pulou do peito, tive de me controlar para não deixar transparecer a esperança que emanava de mim, e com cautela perguntei o que tinha acontecido.. Ele parou e ficou me encarando por um momento, nada me respondeu, no segundo seguinte pegou minha mão e colocou em seu peito, fiquei sem reação! E então ele disse:
- Sente isso?
- O que? 
- Meu coração, está disparado!
E realmente estava! A essa altura do campeonato, eu já estava me tremendo toda, rezando pra que ele não percebesse. Ele fitou minha reação e continuou.
- Lembra quando eu te falei sobre a menina que fazia meu coração disparar? É você Má! Mesmo sem saber se é reciproco, precisava falar com você, não podia mais guardar isso! 
 Mal podia acreditar em tanto clichê, dessa vez não era mais um dos meus devaneios românticos, estava realmente acontecendo, era quase surreal.. Não consegui dizer uma só palavra! Então me aproximei lentamente, coloquei a mão que estava livre em seu rosto, olhei em seus olhos.. e não precisei dizer nada! Ele colocou sua mão firme em minha nuca, podia sentir o calor do seu corpo colado ao meu, nossos rostos ficaram mais próximos ainda, e então..o primeiro beijo! 
 Ah! Inexplicável o êxtase que percorria meu corpo! Queria gritar ao mundo minha felicidade! Sentia o rosto quente e as pernas moles. Ele era o cara perfeito, não podia acreditar no quão sortuda eu era, meu próprio conto de fadas, com direito a borboletas no estômago e tudo o mais!
 As semanas seguintes foram incríveis, não achava possível nos darmos melhor até a nossa primeira vez, e acredite, era possível sim! Na cama ele era insuperável, parecia que estava dentro da minha cabeça, parecia saber tudo o que eu queria e gostava!

  Mas passado algumas semanas, a tal ex começou a ligar pra ele, pedindo pra voltar, choramingando e fazendo chantagens baratas, dizia que não conseguia comer, que não conseguia dormir, até fez a própria mãe ligar pra ele. Ela sabia que ele se preocuparia, pois apesar de ter terminado com ela, ainda se importava, afinal de contas, era cavalheiro. Eu não tinha problemas com isso, só me sentia mal por ser o motivo da dor de alguém, já tinha passado por isso antes e não desejo a ninguém. Mas a situação mudou de figura, quando ele pareceu ficar balançado com tudo aquilo. Então tomei uma decisão que parecia ser a mais sensata.. pedi um tempo, não porque eu queria aquilo, mas era o que ele precisava, um tempo para resolver as coisas com ela de uma vez, um tempo pra que ele fosse só meu, eu estava disposta a fazer qualquer coisa por ele, inclusive esperar, já tinha esperado tanto pra acha-lo, o que seria mais alguns dias? 
 O que eu não sabia, é que ele era absurdamente orgulhoso, e seu orgulho não deixou que ele entendesse meus motivos de fazer aquilo, foi embora sem nada me responder. Eu tola, achei que ele voltaria.
 Três semanas se passaram e nós ainda nos víamos quase todos os dias, mas apenas como amigos, e era uma tortura estar perto dele sem poder toca-lo. Estava começando a ficar neurótica com toda essa demora.
 Eu esperei, esperei, esperei… e nada! De alguma forma, eu sabia que ele queria voltar, mas algo o impedia, e esse algo era seu orgulho ferido! E então eu percebi que eu continuaria a esperar em vão!

 Vi na primeira festa que surgiu, uma oportunidade para me embriagar e afogar todas as magoas. Então me maquiei, coloquei meu melhor vestido e sai.. bebi uma, bebi duas, bebi incontáveis doses de whisky, cowboy, nada melhor do que whisky para anestesiar um coração ferido. Lá pelas tantas da noite as coisas começaram a ficar obscuras.. precisava sentar, não tinha onde, foi quando vi um rosto conhecido na multidão, um cara que estagiava comigo, não o conhecia muito bem, não me importei, precisava de um apoio! Pedi ajuda para ir pra casa.. foi o que bastou para que o presunçoso achasse que estava dando em cima dele - sem pensar duas vezes me beijou. Num súbito impulso  o afastei, corri para fora da festa e chamei um taxi, como cheguei em casa, é um mistério.
 No dia seguinte ressaca, ressaca e mais ressaca, pior que isso, a ressaca moral. Minha razão argumentava com o fato  óbvio de que estava solteira, e que o ocorrido da noite não tinha sido nenhuma traição, mas minha consciência me enchia de uma culpa, que eu realmente não sabia se deveria ter. Meu coração pertencia a ele, mas não sabia se ele algum dia me pertenceu . Contar ou não contar sobre a festa?  a dúvida me corroía, a ressaca fazia seu corpo doer, e a ansiedade não me deixava dormir.
 Acabei contando, é claro que esperava que ele entendesse - como foi ingênua!- agora eu tinha ferido sua masculinidade. Ele simplesmente perdeu a vontade, foi tudo o que ouvi dele.  Deixei todo orgulho e amor próprio de lado e implorei, me humilhei  por uma segunda chance, e ele frio, só respondeu novamente que tinha perdido a vontade e isso era tudo que ele tinha a dizer.

 O torpor em que estava mergulhada , me impediu de perceber as noite em que passei em claro, remoendo, revivendo em minha memória todos os dias bons - que prática mais masoquista! - tudo o que eu era agora, eram olhos inchados e unhas roídas. Tudo que queria era deixar de existir, sem dor, sem pensar.. até que toda essa tristeza deixasse de  ser. Perdida,  no álcool achei um escape para tudo isso.
 Os dias foram se arrastando enquanto me embriagava cada vez mais. Algumas amigas, preocupadas, resolveram intervir, achavam que me tirar um pouco de casa era a solução, então decidiram me levar a uma festa, pensando que aquilo iria me animar, grande erro! Quando chegamos a festa, adivinha quem foi a primeira pessoa que entrou em meu campo de visão? sim, o próprio! Queria morrer.
 Fiquei o observando de longe, meus olhos inquietos e curiosos, escondidos por de traz das lentes escuras do óculos, perseguiam todos os seus movimentos. Algumas horas mais tarde, ele veio falar comigo, era claro que ainda existia algo entre nós! Ambos ludibriados pelos álcool ficamos conversando, apenas coisas triviais, trocando olhares sugestivos por horas, então ele disse que me levaria pra casa , a merda estava feita!
 Quando chegamos em meu prédio, o convidei para subir, iludida que dai para frente nos acertaríamos - que estúpida! -, ele me comeu sem escrúpulos, sem remorso me largou estirada na cama e foi embora sem avisar. O cara que antes era o cavaleiro da armadura dourada se transformara no carrasco que arrancou meu coração e o levou numa bandeja de prata.
 E o que ouvi dele no dia seguinte foi que  tinha voltado com a ex namorada.. Depois disso nunca mais tive notícia alguma dele. 

 Cansada de sofrer, prometi a mim mesma que homem algum, seria homem o suficiente pra partir meu coração de novo! Então me espelhei em todos os caras escrotos que passaram pela minha vida, me tornei fria, a menina que amava filmes de romance deixou de existir, e as borboletas que antes habitavam meu estômago, se foram pra sempre! 

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